24 setembro 2006

Os pais

Este é um assunto que espero tenham paciência.

A minha família. Como iria eu introduzir este tema? Como iriam reagir? Todas aquelas questões que nos colocamos ao longo da nossa vida surgiam em flash dentro de mim. Mas o certo é que teria de contar.

Para que entendam o porque terei de regredir um pouco.

A minha família, composta por pais e um irmão 5 anos mais novo, é natural do meio rural. Emigrantes em pais muito desenvolvido durante décadas. Regressados às origens há já algumas décadas também. Eu saí de casa muito jovem para a grande cidade para ingressar na universidade. Eles mantiveram-se por lá, onde eu os visitava com bastante frequência. Aquela que era obrigatória a qualquer estudante universitário.

Os meus pais sempre foram muito possessivos. Tudo era segundo as normas deles. Inclusive o curso superior que haveria de frequentar. O que não aconteceu. Pela primeira vez eu fiz e decidi algo que eu queria. O que originou muitos conflitos entre nós, mas que acabaram por se resolver. Tal como todos os outros problemas ficavam sempre resolvidos. Costumo dizer que esta família vive como se nunca tivesse problemas. Mas está sempre tudo por resolver…

Também a compra da minha primeira casa, aquela que tive de abandonar por estar desempregado, foi conflituosa, pois eles achavam que eu deveria ficar a viver em casa deles, na aldeia, até casar. Seria a assinatura da minha declaração de óbito oficial. Claro que não aconteceu. Comprei a casa, apesar dos conflitos.

O primeiro a quem contei foi ao meu irmão. Precisamente e ironicamente na noite de natal anterior a termos decidido viver juntos. Ele achou que aquilo era uma fase e que iria passar. Afastou-se por algum tempo. Penso que a informação deve ter mexido com a sua masculinidade. Mas mais tarde voltou a aproximar-se, mas sempre e sem tocar neste assunto. Tornou-se assunto tabu entre nós. Respeitei.

Depois veio a minha mãe. Ela soube-o num dia em que eu tinha dito a o meu irmão que lhe ia contar e este teve o descaramento de me proibir de o fazer. Como se ele fosse mais um a controlar a minha vida. Até ali eu deixara os meus pais tomarem algum controlo sobre ela, mas ao meu irmão nunca. E, durante a conversa que decorria no quarto e eu lhe tentava explicar as razões que me levavam a querer contar à mãe, o nosso tom de voz elevou-se e a nossa mãe ouviu a discussão.

Após ele ter saído de casa chateado a minha mãe veio ter comigo perguntando o que acontecera. Tentei inferir que não era nada de especial, que era assunto nosso. Ela começou a pressionar mais uma vez e como sempre, querendo saber o razão daquela discussão. Resolvi induzir então a conversa e levá-la a deduzir tudo. Assim aconteceu. Depois de ter dito aquelas coisas que todos sabemos, sobre “ser algo que tu não vais gostar de ouvir, etc.”, ela perguntou-me: “vais dizer-me que és homem sexual? É isso?”

Aquela frase causou-me algum humor, pois a minha mãe nem sabia dizer a palavra correctamente. Corrigi-a e falamos sobre o assunto. Ela chorou bastante, como era de calcular. Pediu-me incessantemente para procurar ajuda, para me tratar, para me curar. Pediu-me que voltasse a viver em casa deles, que ela me ajudaria a ficar bom. Tentei explicar que aquilo não era doença, que não tinha “volta”.

Sugeriu-me que me poderia casar rapidamente, porque assim aquilo passava. Resolvi despedir-me dela e regressar a minha cidade. Pensei que deveria deixá-la pensar e reflectir sobre aquilo tudo. Depois voltaríamos a falar. Afinal eu tinha deixado uma bomba nuclear nas mãos dela.